2 de dezembro de 2010

Dureza...

A primeira história que resolvi compartilhar foi uma das que, em breve, desapareceriam da memória, se não tivesse resolvido criar o blog.
Nos primeiros anos de magistério, e nos outros também, estava sempre dura. O dinheirinho que sobrava era reservado para as necessidades mais urgentes e emperiquitar-me não fazia parte das prioridades, apesar de hoje achar que deveria ter sido.
Mas não se trata de futilidades... Estava com o par de sapatos pedindo aposentadoria e, obviamente, não tinha planejado comprar nada. Era um bom sapato. Estava apenas um pouco esbeiçado. Poderia esperar. Precisava juntar uma grana e comprar alguns itens para a casa, que julgava verdadeiramente essenciais.
Um dia, sempre há esse tal dia, fui trabalhar com o incansável calçado, que ainda deveria durar pelo menos até o próximo pagamento. Notei que a sola tinha vontade própria e decidiu, por sua conta , dar uma leve descolada imperceptível, lógico. Ninguém notaria.
Lecionava no primeiro segmento do fundamental, para crianças de aproximadamente oito anos. Nesta fase, elas começam a perceber tudo, até mesmo o que não devem, mas a sola ligeiramente solta, isso: jamais!
Subíamos todos os dias, depois de formar e cantar, uma escadaria por onde puxava a fila daqueles alunos alegres e dispostos a realizar milhões de descobertas por segundo, das quais me orgulhava de ser a orientadora. Íamos felizes. Eles perguntavam sobre a agenda do dia e, animados, venciam as escadas atrás de mim.
Naquele famigerado dia, enquanto toda essa maravilha acontecia, um dos meninos cutucou meu ombro, educadamente, e fez um sinal, parecendo que gostaria de falar-me algo no ouvido. Abaixei-me, não muito, pelas razões que quem me conhece já entendeu, para saber do segredo que ele falaria:

__ Ô tia, seu sapato tá falando!

Não houve jeito. Tive de deixar tudo o que tinha na carteira na sapataria mais próxima depois do horário de saída.

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