25 de maio de 2011

Modelo destruído

O bafafá sobre o livro didático aprovado pelo MEC e reprovado pela opinião popular, trouxe à tona uma história que teria ficado esquecida, caso a mídia não tivesse proposto o referido escândalo...

Sempre gostei de estudar línguas, especialmente a nossa, e passei muito tempo da minha vida, e ainda passo, buscando subsídios para aperfeiçoar meus registros ainda muito falhos e para aprimorar meus argumentos em sala de aula, pois juro que prezo o "bom" português (repleta de preconceito nesse comentário).

Confesso que a cada dia fica mais difícil agradar a garotada e isso começa a me apavorar. Cada texto selecionado é odiado pelos alunos, que oriundos de famílias muito desprovidas de recursos, não foram fonte da  tal cultura valorizada pela escola. De forma alguma quero dizer que não tenham cultura, absolutamente. Trazem na bagagem a riqueza da cultura popular, mas a maior parte dos textos está impregnada de uma cultura letrada, que quase nada diz a eles, porque não conseguem fazer as relações necessárias exigidas pelo intertexto, para que as possibilidades de interpretação se efetivem. Logo, se não entenderam o sentido, a língua não cumpriu o seu papel - eu também não.

Com essa dificuldade de conquistar o aluno, uma vez, enquanto "doutrinava" uma adolescente repetente e que - dizem, pois não tem laudo - é disléxica, ouvi um discurso que me tirou o chão. Essa menina, enjoada da minha insistência de fazê-la entender a norma padrão do português, gritava para mim, "Você pensa que eu quero falar como você? Não quero! O jeito que você fala é ridículo. Prefiro o meu." Fiquei completamente atônita. Pensava ser para os alunos um modelo. Ficou evidente que eu, de verdade, sou uma chata, que tenta impor um modo de expressão rejeitado pela maioria e que aquela menina teve a coragem de dizer.

Toda a polêmica do livro, evidentemente referindo-se aos assuntos de linguagem (variantes linguísticas, linguagem formal e linguagem informal) só terá utilidade se nós, professores, pararmos para refletir a respeito do assunto. É muito claro para mim, hoje, que a velha função da escola não faz sentido para o aluno das classes de menor prestígio social. É preciso redefenir nosso papel, rever objetivos e reelaborar práticas. Não que eu saiba como, mas todos os dias essas ideias me acompanham no trabalho.

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