11 de novembro de 2014

Torre de Babel

Um desses dias, entrei em uma turma de aceleração de estudos para uma bronca de rotina, assim que percebi que vários alunos estavam na janela em interação complicada com alunos de outras turmas no recreio. Um grupo difícil, fora da idade, ávido para aprontar e quase sem vontade de estudar. Tudo parece mais interessante: perambular pela escola, burlar regras, implicar com os menores, matar aula. Poderia elaborar uma lista enorme de coisas mais importantes que assistir às aulas, realizar tarefas e tudo mais que propomos a eles.

Falava sobre os problemas causados em ficar gritando aos alunos que estavam no recreio e atirar coisas, quando uma menina disposta a argumentar disse que estavam em "aula vaga" e como era ruim ter intervalos durante as aulas.

Realmente, por mais que procuremos evitar as janelas do horário, como chamamos, algumas vezes é inevitável. Expliquei isso a ela.

Pronto, confusão formada para quem tem dificuldade nas conexões... Janela da sala, janela do horário... Estabelecemos um diálogo maluco. Eu falava sobre as janelas do horário e ela sobre a janela da sala e não nos entendíamos mais. A impressão era a de que falávamos línguas diferentes.

A professora que, então, pegaria a turma após a janela do horário, ficou um tempinho perplexa com a conversa de velha da praça que se estabeleceu, mas entendeu a confusão e chamou atenção para o que havia formado a dissonância. 

Foi impossível continuar a conversa, mas o divertimento, garantido.

Um comentário:

  1. Viviane, muito engraçada a sua experiência, ri muito...
    Também tive uma experiência parecida em um colégio do Estado, em Madureira, próximo a uma comunidade muito violenta, só não foi tão divertido.
    Ainda estava iniciando a minha vida de professor, quando fui para esse colégio. Em uma reunião pouco antes das aulas a Direção pediu para que os professores apresentassem as normas de convívio para os alunos, evitando assim desentendimentos durante o ano letivo.
    As aulas então se iniciam, no primeiro dia vou até a minha primeira turma e começo a apresentar as normas indicadas pela Direção: não pode celular na aula, saída para o banheiro apenas para um aluno de cada vez, não pode gritar ou ofender, etc.
    A medida que vou falando a turma vai literalmente explodindo com todo o tipo de negação, inclusive aos berros de "sai fora!", "tá de sacanagem!" e outras observações impublicáveis.
    Nesse momento fiquei meio atordoado, afinal regras são parte da vida em sociedade, nada mais natural e além disso ninguém estava exigindo nenhum absurdo.
    Devido a falta de experiência, que hoje acredito que tenho, comecei a ficar meio aflito. Então, do nada, me veio na mente uma frase que um colega meu, muito inteligente e que tem um grande censo de humor, as vezes dizia em situações que as pessoas se colocavam ferozmente contra ele: "calma gente, sou civil e estou desarmado", o que geralmente provocava até risos e relaxamento nas discussões mais acaloradas. Então soltei essa pérola no meio da sala.
    Quase todos ficaram mudos por um instante, até alguém gritar, o professor é civil! Demorei então um momento para perceber que na verdade eles tinham entendido que além de ser professor eu também era policial civil, e sendo assim, os estava ameaçando. Pois a comunidade era dominada pelo tráfico e a guerra contra a polícia (militar ou civil) fazia parte do cotidiano.
    O resto da aula foi o caos, onde no meio do tumulto procurei deixar o mais claro possível que não era policial, não estava armado e portanto, não estava ameaçando ninguém.
    A partir desse dia procurei pensar mais nas palavras que vou usar em sala, evitando ao máximo o ruído no diálogo, que as vezes ainda acontece, mais não mais de forma tão forte.

    Abraços,
    Eduardo Queiroz

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